Intercorrências
Avise ao seu pequeno argentino: “el control no existe”.
O coração frágil da prima.
Os exames não muito otimistas da filha canina.
O marido mal do estômago.
A vida e suas intercorrências. Ninguém conscientemente pede por elas, mas todo mundo recebe sua dose anual de emoções não planejadas. Há quem tente encontrar porquês em tudo e, sendo jornalista, não vou mentir que a explicação dos fatos sempre me atraiu. No entanto, tenho pensado que alguns acontecimentos vêm com uma única missão: nos lembrar da devida desimportância de algumas coisas – talvez até da nossa própria.
Calma: não estou convidando ninguém a uma crise existencial, pelo contrário. Quero falar sobre a necessidade primordial de (saber) derrubar alguns pratinhos, como bem ensinou minha amiga Joice.
Entre os sustos com a Chloé, a prima e o marido, eu olhei para o cronograma da newsletter e disse: espere a sua vez. Eu sei, eu sei, não é tão grave como não pagar a conta de luz ou ver o nome no Serasa, mas para mim foi difícil, porque a news é um compromisso meu. Falhar com isso, portanto, é responsabilidade minha. “Calma, Luísa, não é tão sério assim”. Eu sei, eu sei, mas e as vozes da minha cabeça que já estão acostumadas a essa cobrança?
Aposto que na sua mente também há exigências que podem até não ser essenciais para viver, mas são, sim, importantes. Aquele armário que você tanto quer ver organizado, o tapete que nunca foi lavado, o curso de artesanato/de idiomas/de vinhos que você queria fazer e a pilha de livros que você prometeu (prometeu!) que ia concluir este ano sem falta. A infame lista do dia 1º de janeiro com promessas e metas de uma vida melhor e mais consciente.
Não deu.
Não deu.
Não deu.
Diante dos sustos que tomei recentemente, percebi que o melhor a fazer era desistir de ser a equilibrista do ano e deixar alguns pratinhos conscientemente irem ao chão. Ca-ta-pluft. Quebrou. Oh, que pena.
A gente sabe que saúde é o mais importante, mas esquece. A gente sabe que não tem o controle sobre nada, mas esquece. O ego, esse pequeno argentino que nos habita, insiste em nos convencer do contrário.
Refletindo melhor, concluo que essas intercorrências são o jeito que (essa coisa esquisita que é) a vida encontra de nos fazer constatar, de uma vez por todas, que pouco, pouquíssimo, realmente importa.
Estamos prestes a fazer contagem regressiva para novos 365 dias, com potencial para trazer todo tipo de surpresa, das boas e das nem tão boas assim. Para mim, permanece o desafio de aceitar que não é possível prever coisa alguma. Não há bola de cristal ou Chat GPT que resolva.
O que dá para fazer, então? Longe de mim arriscar dar conselhos ou fazer discurso furado de coach. Vou registrar aqui como um lembrete para mim mesma sobre o que eu espero conseguir em 2026: diante dos meus privilégios, lembrar de pisar mais na grama, passar um café fresco sempre que possível e afagar os cachorros.
Ah, sim, e avisar ao pequeno argentino: el control no existe.
Queridos assinantes, tem gente nova chegando por aqui <3 Sejam muito bem-vindos! Estive ausente por um momento, mas estou de volta! Aproveito para agradecer ao meu querido amigo Rafa Tourinho, que revisou a crônica de hoje e que também está por aqui no Substack com a excelente newsletter O questionador.
Obrigada pela companhia e, se gostou do texto, que tal compartilhar com os amigos?
Até breve!

E por meio dessas e de outras, venho pensando tantos pensamento...
Adorei essa edição, Luísa!